Durante aquela semana, enquanto as
águas baixavam, eu caminhava rio abaixo todos os dias procurando pelos
destroços da balsa. No início da corredeira de seis quilômetros, quando o rio
está baixo, pode-se cruzar a fronteira sem molhar os pés, por cima de uma
barreira rochosa que desce da serra, ligando o Brasil com a Guiana. Junto a esse
paredão, pedras enormes, trazidas pela correnteza durante milhares de anos e que lá permanecem imóveis durante as estiagens, inacreditavelmente parecem ganhar vida durante as enxurradas, lançando-se desesperadamente contra o paredão rochoso, como se
quisessem atravessá-lo para poder seguir seu caminho rio a baixo, e
inacreditavelmente muitas atravessaram mesmo, abrindo inúmeros túneis na barreira
rochosa. Outras arredondadas e desgastadas, como uma bola de futebol, estão a
meio caminho no fim do túnel, onde podem ser encontradas quando as águas estão
baixas, imóveis esperando a próxima cheia. Algumas destas pedras se desgastam
totalmente, antes de poderem sair do outro lado da barreira, deixando em seus
caminhos túneis cônicos, inacabados, por onde passam as águas das cheias
espremendo-se nas fendas, que daqui a mil anos talvez, outra pedra rolada de
alguma serra distante, trazida pelas águas, atravessará por fim a barreira de pedras. Entrei várias
vezes nesses túneis, quando o rio estava baixo, procurando cascalho
diamantífero, em alguns deses tuneis pode-se entrar de pé no início e imaginar o tamanho da
pedra que rolando nas águas o escavou.
Havia uma pedra muito grande perto da
barranca, onde às vezes eu ficava em cima pescando, essa pedra também era
polida, mas eu imaginava que fossem as areias trazidas pelas águas, por
milhares de anos que a desgastavam, sem acreditar que o rio tivesse força suficiente
para movê-la. Enganei-me, nos dias que procurava pelos destroços da balsa
escutei incrédulo o ruído da pedra grande, agora submersa, chocando-se contra o
paredão.
Após alguns dias o rio Mau
tornou a baixar e encontramos presos nas pedras da corredeira, o motor e o
compressor, a balsa de borracha descera serra abaixo. Com ferramentas
emprestadas, abrimos o compressor e o motor, que secamos e lubrificamos.
Colocamos o equipamento recuperado na canoa e fomos procurar, no fundo do rio,
o local onde tínhamos encontrado as três pedras que formavam a entrada da
câmara submersa, mas a forte enxurrada que tinha nos surpreendido, tinha trazido o arroto, o cascalho removido pelas
máquinas que dragavam o leito do rio, nos garimpos localizados a cima da
cachoeira. e toneladas de areia e pedras aterraram o estirão do rio, em frente à
caverna, soterrando a entrada do nosso garimpo. Quando fui embora, nem
lembro por quantos quilates de diamantes vendi a espingarda e o resto do
equipamento recuperado para o Picuá, antes de deixar o garimpo, mas tenho
certeza que até hoje ele ainda não me pagou, pois nunca mais voltei lá para
cobrar.
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