sábado, 23 de junho de 2012

História de Onça - Parte XXI


       
    TERRITÓRIO IANOMAMI

             Acreditando que ninguém possa partir e nem regressar sem levar ou trazer penas nas asas da siricora, respondi a muitos anos, quando um amigo, no leito de morte, me perguntou olhando nos olhos se eu acreditava na existência Deus, que sim. Achei melhor dizer que sim, porque se eu dissesse que tanto faz, não iria ajudar em nada, naquela hora, em que ele teria que enfrentar a onça inevitavelmente, com ou sem Deus, levando junto as penas da siricora, que nunca seriam esquecidas na beira do caminho que por acaso houvesse e não faria diferença então existir, ou não, recompensa alguma para quem deixasse o coração para trás ao partir, assim como ele teria  infelizmente que fazer logo.      
            Assim, como o vento breve desliza nas asas ligeiras da siricora, se faz quando urgem às horas, quando os sonhos e as esperanças já não dispunham de tempo, é que se vê com clareza explícita a plenitude, na magnífica simplicidade do lago, e de olhos arregalados ficamos saltando dentro da água, como fez o sapo que a bruxa falou outro dia, querendo ver também onde estava o tal lago, cuja beleza incomparável ouviu dois pescadores comentando, inconscientemente convictos de que não há nada do lado de fora de nossas próprias recordações, de nosso próprio, único e finito lago.
          Na cantina, pedi papel e lápis para escrever os confusos números dos telefones de conhecidos da cidade, que naquelas condições mal recordava e me deitei novamente na rede, preocupado com a demora do Chaguinha, o piloto da voadeira que ainda não voltara dos garimpos da mata, onde fora fazer algumas cobranças, antes de voltar para a cidade.
        Quando escureceu e começaram a chegar os primeiros fregueses, o cantineiro ligou o rádio á todo volume. Logo a cantina estava novamente lotada e alguns garimpeiros jogavam baralho, á peso de ouro, em meio a gritaria de homens e mulheres que tentavam se fazer ouvir, enquanto bebiam escutando a música num volume exagerado. Mantendo os olhos fechados, fingia não escutar os comentários que fazia cada garimpeiro que entrava, vindo diretamente me olhar na rede antes de começar a beber.
         Era terrivelmente angustiante aquela espera, em meio ao barulho ensurdecedor da cantina, a falta de ar, a insônia e as dores insuportáveis, mantendo incontroláveis meus pensamentos desordenados que não me davam trégua, não me permitindo adormecer e nem tão pouco acordar em meio aquele horrível pesadelo. Por fim, o dia amanheceu sem que eu percebesse e quando à noite chegou novamente, alguém sacudindo a minha rede falou que o Chaguinha acabara de voltar da mata e que partiríamos ao amanhecer. Foi essa a última lembrança lúcida da corrutela do garimpo Santa Rosa.
         Na madrugada seguinte antes de partirmos, quando fui carregado pelos passageiros até a voadeira e deitado no assoalho sobre um pedaço de lona, eu já estava quase em coma, despertando apenas quando sentia dores insuportáveis nas costas, causadas por algum movimento brusco da canoa descendo as correntezas, ou quando a água do rio, em alguma corredeira, respingava sobre o meu corpo febril. Às vezes fazia silêncio e eu abrindo os olhos me via só na canoa, pois o Chaguinha parava em alguns pontos do rio e entrava na mata, seguindo pelas trilhas que levavam até aos garimpos, onde buscava outros passageiros que iriam com ele para a cidade ou para fazer a cobrança de algum ouro devido. Enquanto isso os outros passageiros esperavam pelo Chaguinha na sombra da mata da beira do rio, enquanto eu deitado no fundo da canoa sem poder levantar, já não podia suportar a dor e a terrível falta de ar causada pela anemia profunda, que não oxigenava suficientemente o meu sangue..
            É difícil aceitar o que não se pode mudar, demorei muito para acreditar que aquela malária tinha vindo mesmo para ficar e quando contrariado, tive que aceitar a cruel realidade, primeiro senti raiva, por ter que desistir radicalmente de todos os meus planos, depois piorando mais e mais a cada dia, tive que começar a pensar na morte, como uma possibilidade imediata. Então a raiva foi aos poucos cedendo lugar a uma tristeza melancólica, cuja saudade dos amigos e familiares doía no início, muito mais que a própria dor. Por fim quando a dor se tornou insuportável a ponto de sufocar os últimos vestigios de esperanças, a desconhecida e sinistra morte, passou a ser a última e única alternativa possível contra aquele insuportável sofrimento, o último refúgio.
            Na última vez em que abri os olhos durante aquela viagem, a voadeira estava parada num remanso do rio. Eu estava só, pois os passageiros tinham descido para esticarem as pernas, caminhando pela mata. Tinham deixado uma espingarda encostada no banco da voadeira, quase ao alcance da minha mão. Então de repente pensei em terminar ali aquele sofrimento e até hoje ainda não sei se o teria feito, pois naquele momento uma mulher desconhecida, da qual nunca vi o rosto, subiu na canoa, sentou ao meu lado colocando minha cabeça no seu colo e me serviu delicadamente algumas colheradas de mingau de farinha de trigo. Ainda lembro de sua voz dizendo carinhosamente, que já estávamos quase chegando na boca da mata.
            Na hora certa, até mesmo a morte se faz necessária, como nessa historinha de onça que o sulista conversador me contou, naquela noite em que passou com seu companheiro, na minha caverna na barranca do rio Maú. Depois de comerem todo o trairão que fora assado por mim, na noite anterior, nos sentamos na areia, ao lado da fogueira de frente para o rio, vendo as águas recém caídas da cachoeira, passando com pressa pelo clarão do fogo refletido no rio. Os dois de barrigas cheias, depois de dias de fome, estavam eufóricos por terem saído são e salvos de um problemático garimpo de diamante, em que estavam trabalhando. O homem moreno de bigode negro era um bom contador de historias e uma das muitas que ele contou naquela noite, me fez rir muito também. Iniciava com um fazendeiro com um revolver na cintura, sentado na varanda de sua casa grande, de frente para a estrada, por onde passava naquele momento um andante desconhecido e o fazendeiro sem ter com quem conversar, resolveu chamar o homem, oferecendo-lhe sombra e água fresca. O desconhecido que aceitou prontamente o convite, olhou para dentro da casa antes de sentar-se, e vendo pendurados nas paredes vários couros de animais caçados pelo fazendeiro, imediatamente se pós a contar, sem parar, histórias de caçadas impossíveis, fazendo com que o fazendeiro se arrependesse mil vezes de ter convidado o mentiroso a entrar.
            Quando o feijão com jabá começou a cheirar na cozinha, o dono da casa que escutava calado as mentiras do desconhecido, imaginava como faria para se livrar do intruso mentiroso antes do almoço ser servido, sem ter que ser muito descortês.  Quando falhou a espingarda do andante, que se deparara na encosta de uma montanha, com uma onça pintada enorme, tendo que fugir correndo para dentro de uma caverna, sendo perseguido de perto pela onça e encontrando ao chegar no fundo da caverna escura, mais meia dúzia de olhos vermelhos de outras onças que lá se encontravam, o fazendeiro perdendo a paciência aproveitou a oportunidade, sacando então seu revolver e encostando o cano na cabeça do caçador de onças, perguntou enraivecido. - Não vai me dizer que tu escapou dessa, seu filho da puta? O mentiroso pego de surpresa pela reação inesperada do fazendeiro e sem encontrar nenhuma outra alternativa melhor no momento, respondeu. - Não seu, eu não escapei não, naquela vez eu morri e... As onças me comeram !
          
          Todo mateiro amazonense sabe o que é um terreiro de curupira, mesmo que não saiba quem ou o que deixa aquele pedaço de chão em meio à selva, com o diâmetro de dezenas de metros completamente limpo, varrido sem nenhuma folha caída, seca ou verde. Dizem que é o curupira que mantêm o seu terreiro caprichosamente limpo e varrido, e por incrível que pareça a mata parece ser mais sombria nas cercanias destes terreiros, mais silenciosa e misteriosa. Talvez seja apenas superstição, mas quem andando só, no centro da mata, encontra um terreiro destes fica admirado, olhando aquele círculo completamente varrido, e mesmo sem querer redobra os cuidados aguçando os sentidos, escutando atento a mata sombria e silenciosa, esperando instintivamente a qualquer momento o ataque surpresa do curupira dono, do terreiro.
             Naquele dia nublado, quando ouvimos o grito gutural aterrador vindo da picada recém aberta, nos jogamos imediatamente no chão, pensamos que fosse um ataque surpresa de índios hostis, pois o som grotesco que ouvimos parecia ser quase humano, sem ter para onde correr nos preparamos para enfrentar o pior, ali mesmo onde estávamos, com as únicas armas que tínhamos e a quantidade de coragem que dispúnhamos. Havia muitas onças naquela região da floresta, localizada nas encostas de um enorme platô existente na fronteira com a Venezuela, que do avião dava para ver, estendendo-se a perder de vista, como uma enorme mesa verde e plana, sendo aquele imenso platô mais alto que as montanhas localizadas do lado brasileiro.
            Não sabíamos que naquele mês as onças entravam no cio e assim, como todos os gatos, emitem sons grotescos durante o acasalamento, por isso quando tornamos a ouvir novamente o grito desconhecido, já um pouco mais distante de onde estávamos e mais parecido com o esturro de uma onça pintada, o Louro convidou-me para investigarmos e saber se era ou não uma onça. O Louro levava uma espingarda velha, calibre vinte, que quando disparada não sacava o cartucho e eu tinha apenas quatro balas no revólver. Meio à contra gosto com o facão numa das mãos e o revolver na outra, segui o Louro mata à dentro, enquanto o Bernardo e o Goiano que estavam desarmados ficaram nos esperando na picada. Tínhamos andado uns cem metros pela mata, quando nos deparamos com um grande terreiro de curupira, o círculo varrido no meio da mata alta, tinha no centro uma árvore caída que somente a parte mais grossa do tronco ainda não tinha apodrecido. Quando entramos no terreiro, o Louro que seguia na frente esturrou imitando uma onça e imediatamente do outro lado, no início de um declive, descendo em direção á uma grota, uma onça pintada respondeu ao chamado, esturrando também.
            Pronto, não era o mapinguari, nem índios brabos, já sabíamos de quem eram aqueles gritos desconhecidos, mas mesmo assim resolvemos atravessar o terreiro do curupira para tentar ver a onça. O Louro apressou o passo se distanciando uns dez metros de mim e quando comecei a segui-lo tive a leve impressão de que alguma coisa muito rápida tinha se movimentado mais na frente, perto do tronco caído, podia ser uma semente ou galho seco caindo das árvores, um pequeno pássaro em fuga, ou uma alguma brisa batendo na vegetação rasteira.  Não dei importância, me distraindo também, quando o Louro estava quase chegando de fronte ao troco apodrecido, com uma mutuca grande que pousou na minha perna. Parei abaixando a cabeça para tentar matá-la com o facão e foi neste exato momento que ouvi o grito desesperado do Louro e o estampido da espingarda. Instintivamente levei os braços na direção do disparo, apontado o facão e o revólver para a sombra rápida e silenciosa que voava como uma flecha em minha direção disparando ao acaso três tiros simultaneamente, sem ter tido tempo de sair do lugar e nem mesmo ver o que estava nos atacando.
             Ninguém pode prever ao certo, qual será a reação do homem quando é pego de surpresa pelo inesperado. Nestas horas, onde não há espaço, nem tempo para nada, que não seja o que realmente é, pode surpreendentemente sobrar valentia para um covarde e faltar coragem para um valente, que reage, ou não, inconscientemente e independentemente da sua própria vontade.
         O velho Raimundo, o amazonense que teve o pé mastigado pelo jacaré no curral, me contou que quando criança seu pai e seus vizinhos criavam muitos porcos, numa determinada época do ano levavam a porcada de canoa para as ilhas, quando os buritizais estavam com frutas. Lá em meio à fartura de buritis maduros, os porcos engordavam rapidamente, isso se a onça pintada que é exímia nadadora não os comessem antes, por isso, quando começaram a sumir os porcos de uma das ilhas, os vizinhos se reuniram, pegaram as espingardas e foram caçar a onça.
          Na ilha não era muito grande, os homens se espalharam pela mata, para tentar atirar na onça antes que ela atravessasse o rio nadando, fugindo para outra ilha. Um dos beiradeiros,  justamente o que levara junto na caçada o filho ainda menino, foi quem se deparou primeiro com a onça acuada e quando levantou a espingarda para atirar, meteu acidentalmente um dos pés numa toca de paca ou de tatus, caindo de costas indefeso, foi atacado pela onça, enquanto seu filho pequeno, que trazia na mão um facão, tentava defendê-lo golpeando as costas da onça pintada. Quando a onça se voltava contra o menino ele recuava, quando a onça voltava a atacar seu pai, ele voltava para defendê-lo. Os outros caboclos ouvindo o rugido da onça e os gritos do menino  e do pai, correram para ajudar e o primeiro a chegar ao local, foi o irmão do beiradeiro que estava sendo atacado. O mais surpreendente foi, que quando os outros homens também chegaram correndo ao local do ataque, encontraram apenas o menino enfrentando a onça e mesmo gravemente ferido ainda lutava defendendo o pai, enquanto seu tio com a espingarda na mão, perplexo, olhava a cena paralisado, sem ter feito nada para ajudar o irmão e o sobrinho.
            Os beiradeiros depois de matarem a onça, levaram os dois feridos para casa, o menino sobreviveu, seu pai não resistiu aos ferimentos e morreu alguns dias depois, sem nunca entender por que seu irmão não atirou na onça... 

domingo, 17 de junho de 2012

História de Onça - Parte XX


      GARIMPEIROS

         A mais longa das noites se fora, e era ensurdecedor o canto da passarada ao amanhecer  quando o Oliveira foi buscar água na cacimba, para preparar o café. O cheiro forte da fumaça da fogueira recém acesa, da sobra de comida requentada e do café me causava náuseas. Com os olhos fixos na mata, não escutava e nem queria escutar nada, nem mesmo sobre o que os três homens falavam durante o café da manhã e quando o Oliveira se aproximou dizendo que resolveram levar-me até o garimpo Santa Rosa, não respondi, nem discordei, sem me importar com nada mais além da dor que sentia no meu abdômen, cada vez mais inchado, continuei olhando a mata recém a amanhecida, cercando o nosso acampamento, parecendo uma muralha sombria que a noite passada deixara para trás, separando-nos do resto mundo.
            Quando que se chega ao final da picada, sem rancho e sem ouro, quando o jamanchim vazio já não incomoda mais, o fardo mais pesado no caminho de volta, e que nunca se pode deixar para trás é a desilusão. Nestas horas quando os sonhos batem asas como um bando de jacamins em fuga, a desilusão pesando como azougue nas costas do mateiro, estica as alças do jamanxim, o cansaço e a desesperança tornam o caminho de volta mais longo e sem nenhum propósito para quem regressa da mata, de mãos, bolsos e sonhos vazios.
              O Bernardo que gostava de brincar, quando alguém se lamentava de algum infortúnio dizendo, que quando as coisas parecem não estar bem, se deve olhar melhor, para então perceber que na realidade, estão sempre muito pior do que a gente pensa, falou para o goiano que se lamentava da nossa sorte naquele dia, quando retornávamos pela mata sem ouro, que no futuro ainda sentiríamos saudades até dos piores dias em que passamos na selva. Fiquei pensando no que o Bernado falara, enquanto lembrava do que me disse certa vez, um velho chamado Garcia, que o homem sempre vê o passado melhor do que foi, o presente pior do que é, e o futuro melhor do que será. Sim, o Bernardo tinha razão, pois quanto mais nos distanciamos do passado, mais valorizamos o que no futuro jamais teremos novamente. 
           Resignados ou não, no final da trilha, teremos que fazer como fez o caboclo, que na curva do caminho, bem em frente a uma grande pedra retangular, parecendo um altar, se deparou com uma onça pintada. Quando a onça franzindo a testa se preparou para atacar, o caboclo que trazia apenas um pequeno canivete, pronunciou sem querer a palavra virgem, nesse momento a virgem Maria se materializou sobre a pedra retangular. Sem tirar os olhos dos olhos da onça, o caboclo desconfiado aproveitou para fazer três pedidos para a Virgem Aparecida, que se mantinha lá  calada sem se manifestar: - Se você está do meu lado, faça com que eu mate essa onça na primeira canivetada,  se por acaso você está do lado da onça, faça com que ela me mate também na primeira patada para que eu não sofra, mas se você não estiver nem do meu lado e nem do lado da onça, senta aí, pra ver a porrada que vai sair aqui e agora ! 
       Todos os caminhos, se cruzando ou não levam sempre ao mesmo lugar, onde inevitavelmente a realidade da onça, despida de qualquer ilusão terá que ser enfrentada um dia, sem que o caboclo jamais saiba de que lado está, o que nunca pareceu estar, nem do lado da caça e tão pouco do lado do caçador.
           Já era quase meia tarde quando o Oliveira, saindo com os outros dois homens de dentro da escavação no pé da montanha, sacudiu a minha rede, dizendo que me levariam até a beira do rio. Ajudado pelo Oliveira, joguei os pés para fora da rede me levantando vagarosamente e sem olhar para trás segui pela trilha em direção ao rio, sem esperar pelos outros que me chamavam para que os esperassem. Enquanto o Oliveira desarmava as redes e preparava as coisas para a viagem, eu, raivoso e desorientado seguia cambaleante pela mata alta e silenciosa, sem saber e nem me preocupar se chegaria ou não ao rio, pois as dores no meu abdome, a febre, a falta de ar, a diarréia quente e fina escorrendo perna abaixo, me deixava quase inconsciente. O regresso, a distância e o tempo, já não faziam  nenhum sentido no meu estado delirante. Sempre depois de subir alguma elevação pelo caminho, eu me jogava no chão completamente exausto e ficava imóvel, então andava um pouco mais, até cair novamente e ficar olhando para cima vendo as árvores dançando sob o fundo azul do céu silencioso da floresta.
             Na beira do rio, os três homens, forraram o chão com folhas verdes onde me deitaram, enquanto levavam a canoa, o combustível e o motor para a água. Me colocaram depois deitado sobre uma lona plástica no fundo da canoa e o Oliveira seguiu remando rio abaixo em direção ao Santa Rosa, enquanto o Pedro e o velho voltavam para o acampamento no sopé da montanha. 
         O sol forte, que amolecera a lona plástica no assoalho da canoa e queimava a minha pele suada, não me aquecia, tremendo de frio eu quase não entendia o que o Oliveira falava enquanto remava e quando eu tentava responder alguma pergunta sua, minha língua inchada e a boca seca não me deixava falar e tudo se tornava distante de mais, enquanto a conoa descia silenciosa o rio Pacacibi.
        Mais tarde quando sol poente dourou as águas do rio e a noite chegou silenciosa e estrelas enormes surgiram no horizonte distante por cima da mata, no final do estirão, o Oliveira ligou o motor de popa acelerando a voadeira, que com pouco peso ganhou velocidade rio abaixo. A proa da canoa, quebrando o banzeiro, respingava a água quente do rio sobre mim, mais parecendo pedras de granizo derretendo gelo sobre meu corpo febril, então o Oliveira percebendo, me cobriu com a lona plástica que agora era gelada e eu fiquei tremendo em silêncio, olhando para o céu estrelado sem poder dormir e nem acordar, assim como acontecia  há muitas noites, me sentindo nem vivo, nem morto, e sem poder controlar meus pensamentos confusos que viajavam desordenadamente no tempo, trazendo lembranças distantes, como naquela manhã quando me sentei na laje de pedra, ao lado do homem de calção vermelho que não parecia estar morto.
        Ele tinha sido colocado ali, ao nascer do sol sobre a laje, na mesma posição em que fora encontrado no fundo do igarapé, de bruços apoiado no cotovelo direito e no braço esquerdo estendido com a mão aberta, sustentando sua cabeça e parte do tórax que curvado não tocava o chão, numa posição de quem está tentando se levantar, para depois sair andando normalmente.
          De quando em quando, algumas gotas de água com sangue, saindo de suas narinas, pingavam sobre a laje, enquanto eu olhava impotente para o homem morto, vendo a mim mesmo no futuro. Não resisti a tentação de convidá-lo a levantar-se quando me retirei, antes que outros curiosos aparecessem, quase acreditando que ele realmente pudesse, pois para tanto, parecia não faltar-lhe mais nada além de um leve sopro de vida. Palavra que até hoje eu não sei definir e da qual nos recusamos definitivamente a aceitar que seja finita, fechando nossos olhos para tudo que não seja aquilo que desejaríamos ver, acreditando sem contestação em todas as histórias de onça que prometam ultrapassar a barreira do inevitável. Como acreditava aquele garimpeiro que viajava ao meu lado no banco da voadeira, quando voltávamos da mata para a cidade, dizendo que ainda devia um ouro a outro garimpeiro que tinha sido morto por aqueles dias no garimpo e como acreditava que dá azar ficar devendo ouro para as almas, o homem com medo da morte, pretendia pagar sua dívida comprando velas com as gramas de ouro do falecido, que acenderia durante a noite para iluminar o caminho ao paraíso. 
          Durante a viagem, me esforcei ao máximo na tentativa de conseguir transformar em doces para as crianças, aquelas velas desnecessárias que o garimpeiro pretendia comprar quando chegássemos na cidadezinha. Outro dia andando pela cidade, eu que até já tinha me esquecido das velas do falecido, encontrei pelas ruas dezenas de crianças pobres sorridentes, que saiam de uma escola, com as mãos cheias de guloseimas, o garimpeiro supersticioso tinha pagado sua dívida e aquele tinha sido um dia de sorte para as crianças, porque é tarefa difícil abrir os olhos da alma para a realidade.
          O Oliveira me sacudindo com a ponta do pé, enquanto dirigia a voadeira, gritou que estávamos chegando ao garimpo Santa Rosa e já podia ver ao longe as luzes da corrutela. Custei a entender oque ele dizia, meus lábios estavam secos e rachados da febre e o atrito do assoalho da canoa com o banzeiro do rio, me causava horríveis dores nos rins. Sentindo-me muito fraco percebi que estava quase entrando em coma e lembrando que não trazia documentos, me preocupei com a possibilidade de chegar na cidade inconsciente e sem identidade ou números de telefones. Chamei o Oliveira, que parecia não ouvir a minha voz soando fraca e sendo abafada pelo ruído do motor da voadeira deslizando sobre as águas do Pacacibi, cujo meus olhos confusos viam correr desniveladas, como se uma das margens do rio fosse bem mais alta e a canoa pudesse virar a qualquer momento.
         No porto da corrutela, os curiosos me levaram até a cantina onde armaram minha rede nos caibros do telhado de ubim, enquanto perguntavam para o Oliveira quem eu era, davam seus diagnósticos e opiniões, dizendo entre outras coisas que ovelha não é pra mato e que pelo meu estado a Rosinha irmã do Oliveira provavelmente ficaria viúva pela segunda vez.
              Mais tarde, o Oliveira, conseguiu com algum garimpeiro, dois comprimidos de prima quina e dentro de algumas horas a febre diminuiu consideravelmente, sentido melhora me sentei na rede olhando ao meu redor. A cantina estava vazia, os garimpeiros estavam espalhados procurando sombras pelos outros barracos localizados na beira da mata, de onde eu podia escutar suas vozes. Percebendo o meu estado desagradável e a sujeira de minha roupa, resolvi ir até o rio banhar-me. Desci devagar a barranca e entrei na água quente que para mim parecia gelo, estava me lavando quando o Oliveira chegou no porto perguntando se eu tinha melhorado.
       O Oliveira era um caboclo alto e forte, sempre sorridente e simpático, bebia durante o dia todo, quase todos os dias, mas não demonstrava nenhum sinal de embriaguez, sendo traído apenas por seus cabelos lisos, que depois de muitas doses costumavam cair, com mais freqüência, sobre seus olhos amendoados e travessos. Enquanto eu mentia que estava me sentindo bem melhor, ele que já estava com os cabelos nos olhos, disse não ter conseguido mais nenhum remédio contra falcíparum, mas falara com o Chaguinha, um piloto de voadeira conhecido, que voltaria na manhã seguinte para a cidade e prometera me levar junto.
            Já estava quase anoitecendo quando o Oliveira, depois de beber quase todas, voltou para a montanha do Pedro Maranhão. Fiquei sentado no porto, olhando a voadeira sumindo na curva do rio, deixando para trás, soando por cima do tapete verde da floresta o ronco do motor de popa, que em pouco tempo também não se ouviria mais.
          Quando não ouvi mais o som distante do motor da voadeira, ainda fiquei sentado um tempo, olhando o rio correndo sem parar, silencioso em meio à floresta. Depois voltei devagar para a minha rede na corrutela, pensando na música que o Oliveira costumava cantar para a Corina sua avó sempre que se despedia. “Adeus Corina que eu já vou embora, levo pena e trago pena, nas asas da siricora...” 
           A Corina, a bisavó do Oliveira, era uma índia peruana, como ela mesmo me contou no dia em que a conheci, morando numa casa da periferia da capital. Seus cabelos lisos e brancos caíam escorridos, sobre o bronze envelhecido de sua pele centenária e em suas orelhas brilhavam dois brincos de ouro peruano, onde duas pedras de esmeraldas jogavam lampejos esverdeados, nos fios de cabelos brancos mais próximos.
         Naquele dia enquanto conversávamos, chegou um ancião vindo da rua, que sem dar muita atenção para as visitas se deitou rapidamente na rede, que estava armada na varanda. Percebi que o velho de cabelos brancos, curtos e espetados, tinha o braço esquerdo defeituoso, sendo pequeno como o braço de uma criança. Pensei que fosse o marido da Corina e estranhei quando ele pediu café para ela chamando-a de mamãezinha. Depois que a velha peruana serviu o café com biscoito como quem cuida de uma criança, voltou a sentar-se ao meu lado e então me contou como foi o nascimento dele, seu filho, que já estava dormindo na rede depois de ter tomado o café e devolvido a xícara para a mãe guardar. Foi um parto difícil me disse ela, era ainda muito jovem quando engravidou e durante o parto tiveram que puxar a criança pelos braços O recém nascido chorava muito e logo a mãe percebeu que ele não movimentava um dos bracinhos. O pai da Corina então mandou que ela fosse procurar ajuda de um curandeiro que vivia a alguns dias de viagem, rio a cima. Se não me engano, foi no rio Javari que a Corina remou sem parar, até encontrar o tal curandeiro, mas quando ele fez a criança gritar desesperadamente de dor, a Corina sem pensar duas vezes, tomou seu filho dos braços do curandeiro e voltou pra casa chorando também. 
        O tempo passou e o menino cresceu normal como todos os outros meninos da aldeia, com exceção do seu braço esquerdo que ainda continuava assim pequenino, quando eu o conheci, com oitenta e seis anos.   A última vez que vi os brincos de esmeralda da Corina foi num hospital onde ambos estávamos internados, ela saindo com dificuldade de seu leito foi até o quarto onde eu estava, se aproximou da minha cama e colocou sua mão magra sobre a minha perguntado se eu estava melhor. A luz amarelada do sol da manhã, entrando pela janela envidraçada, iluminava as costas magras da Corina, cujos cabelos brancos e sua pele de bronze brilhavam mais que seus brincos de esmeraldas.  “Adeus Corina que eu já vou embora, levo pena e trago pena, nas asas da siricora...”

sábado, 9 de junho de 2012

História de onça - Parte XIX


           
    BALÇAS DE GARIMPO

       
          Quando amanheceu o dia, o Oliveira me ofereceu café, chá de açaí e alguma coisa para comer que eu recusei mal humorado. Falou entre outras coisas que eu não iria me recuperar, minha malaria era falcíparum e o quinino não combatia, teria que voltar para a cidade, falaria com os outros para combinar o que deveriam fazer. Eu sabia que exceto o Oliveira, os outros dois garimpeiros não estavam nem preocupados com a minha sorte, pois o pior do trabalho já estava feito e quanto menos sócios para repartir o ouro no final , melhor seria.
               O combustível do motor de popa que nos restara  era pouco, colocar a canoa no rio e ligar o motor de para seguir em direção a cidade, poderia denunciar a nossa presença e se fossem descobertos, os garimpeiros que ficassem trabalhando, talvez tivessem que fugir, deixando para traz o ouro da montanha. Então quase sem poder falar, com minha língua cada vês mais inchada, pedi para o Oliveira esperar mais uns dias, para ver se talvez por sorte eu melhorasse um pouco.                Depois do café, os três foram trabalhar e eu fiquei na rede tremendo de frio, já sem forças para me debater e espantar as abelhas e os outros insetos vindos da mata, pousando no meu corpo suado e mal cheiroso. Minha respiração se tornara ofegante, minha língua seca parecia não caber dentro da boca amarga, enquanto meu fígado aumentava de tamanho, me sufocando. Ouvindo os homens que trabalhavam, conversando e rindo, eu sentia raiva, como se alguém tivesse culpa do meu estado, enquanto maldizia minha sorte, vendo todos os meus planos queimando de febre.
             A malária é uma enfermidade cruel que pega o caboclo de surpresa. Outro dia, eu estava esperando carona, para ir em direção a um garimpo no Pico da Neblina na serra do Imeri, quando um garimpeiro rodado, que estava também esperando carona no mesmo posto de gasolina, depois de me olhar  por algum tempo, perguntou se eu estava com malária, me achando esverdeado. Sem sentir nada anormal eu não acreditei no desconhecido, seguindo viagem. Desmaiei alguns dias depois no caminho, tendo que voltar para um hospital em Manaus.
          Alguns tipos de malárias são lentos e vão aos poucos enfraquecendo as vítimas, que vão esverdeando, enquanto a febre pontual chega sempre na hora certa, debilitando cada dia mais o malariento, que vai acostumando com a fraqueza constante e com a febre que vem e vai, deixando o “bucho do caboclo cada dia mais quebrado”, as pernas mais finas e os olhos mais amarelados. Nas famílias de beiradeiros malarientos do interior, às vezes a febre chega ao mesmo tempo em todos, sem que ninguém fique de pé, que possa buscar ao menos água para os outros. Outras malarias são mais rápidas, pegando as vitimas de surpresa, como aconteceu com aquele garimpeiro que na mesma semana que contraiu, malaria voltou de avião para a cidade. Chegando numa sexta-feira e ainda se sentido bem, resolveu primeiro beber umas durante o fim de semana, planejando começar o tratamento na segunda feira e vindo a morrer de malária domingo de manhã.
          Num outro garimpo do norte do Pará, um garimpeiro voltava só pela mata, em direção  a pista de pouso, onde pegaria um avião para ir  tratar-se da malaria na cidade. Sofrendo um desmaio e perdendo os sentidos caiu na picada, onde passou a noite desacordado, quando despertou no outro dia pela manhã, soube que nunca mais poderia fechar a boca , as formigas tracuás que gostam de sal, tinham comido seus lábios e desfigurado seu rosto.
            Nas margens do rio Urariquera, na década de oitenta, muitas pistas de pouso clandestinas foram construídas pelos garimpeiros, que riscavam a floresta abrindo inúmeras picadas que se cruzavam em meio à mata, atravessando os grotões que eram esburacados pelas picaretas dos pesquisadores de ouro. Uma árvore enorme foi derrubada durante a construção de uma dessas pistas, ficando caída ao lado da clareira, sem que pudesse ter sido removida e seu diâmetro chamava a atenção dos recém chegados, que nunca puderam passar por cima dela, cujo tamanho descomunal acabou dando o nome para a pista, que se chamava pista do Pau grosso. 
          Na cabeceira da pista, dentro de uma clareira arredondada, um helicóptero barulhento fazia todos os dias muita poeira, pairando baixo sobre motores, bombas e outros equipamentos, que eram colocados dentro de uma rede e levados pendurados no helicóptero para diversos garimpos espalhados pela floresta. Enquanto durante todo o dia, o helicóptero ia e voltava, fazendo as chamadas pernas, dezenas de aviões pousavam e decolavam na pista poeirenta, levando e trazendo da cidade garimpeiros, mulheres, alimentos, ferramentas e motores desmontados, que eram descarregados na beira da pista e de onde eram retirados e transportados pelos diaristas recém chegados¨, que trabalhavam por um grama de ouro ao dia, enquanto não encontravam trabalho fixo nos garimpos. 
         Em meio ao tumulto formado por centenas de pessoas chegando e saindo da pista, nos aviões, das lanchas no rio, ou a pé vindos da mata, bebendo nas cantinas, escutando músicas muito bregas a todo volume, disparando as armas irresponsavelmente em qualquer direção, bêbados e drogados, voadeiras aceleravam seus motores no porto, aviões aquecendo os motores aceleravam também forte na cabeceira da pista, antes de decolarem, enquanto outros sobrevoavam a clareira, esperando desocuparem a pista. para poder pousarem também e na confusão ensurdecedora que se formava, não eram incomuns os atropelamentos de pessoas por aviões. Quando eu estava por lá vi, um piloto norte americano, que pousava seu avião, atropelar dois carregadores, que atravessavam a pista levando um compressor nas costas, um deles morreu na hora, tendo o rosto partido em dois na altura da boca, o outro foi levado de avião muito ferido para a cidade. O piloto gringo, chamado Bill, passou uma semana dormindo e comendo no meu barraco, enquanto remendava seu avião com latas velhas de azeite. Um dia acelerou ao máximo seu avião remendado e mesmo sem rádio, decolou quase batendo na copa das árvores no início da pista, enquanto nós observávamos ele partindo, vencendo com dificuldade o penhasco íngreme da primeira montanha, seguindo voando em direção à cidade. Nunca soube se ele chegou lá, talvez tenha conseguido voltar, o que não aconteceu com muitos dos aviões e helicópteros que por lá voavam. Não longe dali entre as ilhas, um mergulhador de uma balsa encontrou uma corda no fundo do rio, seguindo pela corda encontrou um helicóptero que tinha desaparecido há tempos, onde o cinto de segurança  vazio do banco do piloto, continuava fechado.
              Tendo como pagar, chegar ao garimpo sempre era mais fácil do que sair, porque as pistas de pouso são geralmente muito pequenas, sendo sempre mais fácil descer do que subir. A peso de ouro os motores desmontados na cidade, eram trazidos para o garimpo em partes, junto com passageiros fumantes, sentados no assoalho dos pequenos aviões, entre os galões de combustíveis, alimentos e as peças dos equipamentos. Lá em baixo das nuvens , na mata fechada, sumindo de horizonte a horizonte em qualquer direção, cobrindo cadeias de montanhas, rios e alagados, não há espaço para nenhum avião com pane pousar inteiro. Mesmo assim eu sempre olhava para o sol de dentro dos aviões, queria sempre saber para onde voltar varando, se fosse necessário. Nos garimpos do centro da mata, aonde tudo chegava e saía nas asas do avião, nada custava menos que um grama de ouro e as balsas, compressores, motores e todos os tipos de coisas e equipamentos trazidos da cidade, que tornaram mais ricos ou mais pobres seus proprietários, mais cedo ou mais tarde, inevitavelmente seriam abandonados na floresta, era inviável levá-los de volta à cidade.
           O garimpeiro conhecido pelo apelido de Queimado, foi o único sobrevivente daquele vôo trágico, em que o piloto concordou em levar um motor de volta para a cidade. Quando os aviões decolavam nas pistas pequenas em meio as árvores, na decolagem todos os passageiros se agrupavam junto ao banco do piloto, para equilibrar o peso. Mas naquela decolagem fatal, quando o piloto acelerou e o avião ganhou velocidade na pista, o motor que estava solto no assoalho escorregou para a cauda. Sem poder interromper a decolagem, o piloto acelerou ainda mais, na tentativa de ganhar altura suficiente antes da mata no final da pista, sem sucesso. Quando a cauda chocou-se com as primeiras árvores, o avião partiu-se ao meio incendiando-se e jogando um dos passageiros da mata, que sem nenhum fio de cabelo no corpo e todo franzido, como um maracujá de gaveta, foi o Queimado único sobrevivente. 
           Naquele tempo os helicópteros, velhos e com manutenção precária que voavam como besouros sobre selva, eram verdadeiras bombas relógio, que para sofrer uma pane era só uma questão de tempo. Mesmo assim, alguns garimpeiros costumavam pegar carona agarrados a rede que levava motores e bombas de água, pendurados por um cabo ao helicóptero, embora soubessem que em caso de pane, o cabo que prende a rede é o primeiro a ser solto. Outros garimpeiros eram jogados sem pára-quedas dos aviões por vários motivos. Um destes que saltou sem pára-quedas, tinha ficado milionário poucos dias antes da queda fatal, era ele um pesquisador que encontrou, descobriu uma das grotas mais ricas daquela região.
      Quando um garimpeiro tem a sorte de encontrar muito ouro na mata, duas coisas surpreendentes acontecem ao mesmo tempo. O garimpeiro pobre e todos os problemas relativos ao pobre desaparecem num passe de mágica, surgindo então um milionário sem passado e com futuro inserto. O garimpeiro que saltou sem pára-quedas tinha esquecido do passado, quando saindo da mata, após ter descoberto o ouro, não procurou os velhos e sofridos companheiros de garimpo em quem deveria ter confiado, para garimpar em paz e em sigilo o ouro encontrado por ele. Preferindo vender a grota rica, para um dos poderosos que voavam de helicópteros por cima das arvores da floresta, protegidos por guarda costas armados de metralhadoras, buscando no final da semana nos seus garimpos ricos ,o ouro que um só homem não podia carregar para o avião..
         Depois de negociar a venda de seu ouro recém descoberto, o pesquisador foi mostrar o local, onde cavou algumas “pranchetas”, para comprovar que o ouro era mesmo muito. Comprovado o achado beberam alguns litros de uísque na mata, comemorando a descoberta, que tornaria da noite para o dia, um pobre rico e um rico ainda mais rico. No retorno para a cidade, no meio da selva, o pesquisador  que feliz fazia planos milionários para o futuro, saltou do helicóptero sem pára-quedas e o homem rico, sendo agora o único a saber onde estava o ouro descoberto pelo pobre morto, ficou mais rico ainda. 
        Se repetem sempre essas histórias de onça, onde o rico sempre fica mais rico e o pobre mais pobre, até mesmo nos garimpos que deveria ser diferente, a sorte não é como se pensa, o fator principal. Há muitos interesses escusos por trás de tudo que brilha e quase sempre quando corre a notícia de que um garimpo que causava danos ao meio ambiente foi fechado, é porque já não produzia o suficiente para pagar a todos os interessados. Tratando-se de diamantes, sabe-se que quanto menos melhor e nenhum gringo que tenha investido suas economias nas pedrinhas que brilham no escuro, quer ver um caboclo de Rondônia - onde estão mantidos em segredo uns dos mais ricos depósitos diamantíferos do mundo - com os bolsos cheios de diamantes mais baratos que o preço do mercado internacional.